quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

ICMS – Guerra Fiscal Eletrônica


Notícia publicada hoje pelo “Fiscosoft On Line”, e em vários outros meios de comunicação, dá conta de que o Estado da Bahia passará a cobrar ICMS do remetente da mercadoria, quando sediado em outro estado da federação, adquirida pela internet ou telefone, no momento da entrada dessa mercadoria no território baiano.

Essa é mais uma daquelas medidas arbitrárias que costumeiramente são tomadas pelos estados para fomento da chamada “guerra fiscal”, guerra pela arrecadação.

Entenda o problema:


i) tributação das operações interestaduais:

Segundo o art. 155, VII (alíneas “a” e “b”) da Constituição da República, nas operações interestaduais, o ICMS, pela alíquota interna, é devido integralmente ao estado onde estiver sediado o remetente dessa mercadoria.

Exemplo: saída de SP para BA: pagamento de 18% de ICMS para SP e zero para BA.

Nessas operações, o ICMS só será devido aos dois estados (remetente e destinatário), quando o estabelecimento destinatário for contribuinte do ICMS. Aqui, a saída da mercadoria tributada seria tributada pela alíquota interestadual (menor do que a alíquota interna) – cabendo o pagamento ao estado do remetente, enquanto que diferença (entre a alíquota interestadual e interna) cabe ao estado do destinatário.

Exemplo: saída de SP para BA: pagamento de 7% de ICMS para SP e 10% para BA.


ii) vendas pela internet ou telefone:


A maioria dos centros de distribuição de produtos vendidos pela internet/telefone está sediada na região Sudeste do país, enquanto que a região Nordeste, por exemplo, tem se tornado uma das maiores consumidoras do país ao mesmo passo em que crescem as vendas pela internet/telefone.

Quando um consumidor (não contribuinte) da Bahia compra de um estabelecimento que está sediado em outro estado, a circulação dessa mercadoria gerará ICMS somente para o estado do remetente (regra da constituição acima explicada).

Como o consumo pela internet/telefone aumenta, as vendas “físicas” diminuem, gerando uma perda de arrecadação para estados como a Bahia.

iii) contexto político

Há atualmente uma pressão de estados como Bahia, Mato Grosso, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará, para que o CONFAZ, por meio de convênio, aprove uma regra para distribuição desse ICMS entre os estados remetentes e destinatários, quando as operações forem praticadas pela internet/telefone.

Por interesse político esse convênio ainda não saiu (como se isso fosse resolver o problema – esquecem que a determinação é da própria Constituição da República) e, em razão disso, a Bahia (assim como o estado do Mato Grosso e do Ceará) já arregaçaram as mangas e começaram a fazer “justiça com as próprias mãos”, fomentando outra frente de batalha na já conhecida “guerra fiscal”.

iv) a arma da “guerra fiscal”:

O estado da Bahia lançou mão da legislação estadual para exigir que o remetente das mercadorias compradas pela internet ou telefone pague por meio de Guia Nacional de Recolhimento (GNRE) – documento de pagamento do ICMS em operações interestaduais – em favor do Estado da Bahia, o valor equivalente a aplicação da diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna do Estado da Bahia.

Sem esse pagamento, na prática, as mercadorias compradas serão retidas na “barreira fiscal” do Estado da Bahia até que o remetente efetue o pagamento.

v) consequências desse ataque na “guerra fiscal”:


1- prejuízo para os remetentes das mercadorias que serão tributados pela alíquota interna do estado onde estão estabelecidos e, ainda, terão que pagar a diferença de alíquota para o estado da Bahia.

Exemplo: saída de SP para BA: pagamento de 18% de ICMS para SP e 10% para BA;

2- aumento do valor das mercarias vendidas para consumidores que estão nos estados que exigem, indevidamente, esse tributo;

3- aumento de processos perante o Poder Judiciário, notadamente mandados de segurança para liberação de mercadorias apreendidas nas “barreiras fiscais” pelo não pagamento dessa exigência indevida;

vi) onde se quer chegar:

Fazendo isso, o Estado da Bahia induz que essas empresas de vendas pela internet e telefone instalem em seu território um estabelecimento chamado de “centro de distribuição”.

Assim, a matriz, por exemplo, em São Paulo faria uma transferência interestadual entre estabelecimentos do mesmo titular para o “centro de distribuição” na Bahia que, por sua vez, faria a remessa da mercadoria adquirida pelo consumidor, mediante uma saída interna. Assim, o estado da Bahia arrecadaria o correspondente aos 10% sobre o valor da operação, numa operação que estaria dentro da legalidade. Explica-se:

A saída da mercadoria de SP para BA (mesmo a título de transferência) gerará 7% de ICMS devido pelo remetente para SP. A saída interna dessa mercadoria do estabelecimento baiano, gerará a incidência de 17% de ICMS devidos ao estado da BA. No encontro de contas, considerando a não-cumulatividade, o estado da BA receberia o equivalente a 10% da operação (17% da incidência - 7% de crédito pela não-cumulatividade).

vii) comentário:

É verdade que os negócios evoluíram e que as operações de circulação de mercadorias (fato gerador do ICMS) estão acontecendo de uma forma que foi impensada pelo legislador constituinte, porém, por mais necessária que seja a alteração desses procedimentos, não é fazendo “justiça com as próprias mãos” que os estados vão resolver isso.

Igualmente, sabemos que o direito deve evoluir conforme o desenvolvimento da sociedade e, justamente para isso, o próprio sistema criou mecanismos para promover essa evolução. No presente caso, somente uma Emenda Constitucional poderia mudar esse cenário.

Alô reforma tributária!!!!????

Um comentário:

  1. Professor Marinho.

    Concordo quando escreve que não cabe fazer justiça com as próprias mãos. O que vejo é que estamos diante de um fenômeno impar que não existia em 1988. Se o governo não intervir neste momento teremos realmente uma fuga de divisas tributárias que irá aumentar a pobreza de alguns Estados, principalmente do Nordeste e do Norte.
    Uma Emenda Constitucional é correta sim, para não cairmos na inconstitucionalidade. Mas fica o questionamento se o novo código civil levou mais de 10 anos para sair do papel e como alguns dizem já nasceu velho, ultrapassado, imagino quando sairá esta emenda.
    De qualquer forma, estou apenas pontuando meus pensamentos, pois adorei tudo que voce postou.
    Parabéns.

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Rodrigo Marinho

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